Poema Visual de André Dick
RIACHO DE CASSIS
O riacho de Cassis desliza
Por vales estranhos:
Cem corvos para o que se anuncia
Na voz gentil de anjos
Com grandes movimentos de pinheiros
Quando chega derradeiro o vento.
Tudo desliza com mistérios revoltantes
De campos antigos;
Torres visitadas, parques importantes:
Nessas margens são ouvidos
Amores mortos de cavaleiros errantes:
Mas que forte vem o vento distante!
Os passantes seguem tais vias:
Irão mais corajosos.
Soldados das florestas que o Senhor envia,
Queridos corvos deliciosos!
Façam fugir daqui o camponês astuto
Que quando caminha brinda aos idosos.
LA RIVIÈRE DE CASSIS
La Rivière de Cassis roule ignorée
En des vaux étranges:
La voix de cent corbeaux l'accompagne, vraie
Et bonne voix d'anges:
Avec les grands mouvements des sapinaies
Quand plusieurs vents plongent.
Tout roule avec des mystères révoltants
De campagnes d'anciens temps;
De donjons visités, de parcs importants:
C'est en ces bords qu'on entend
Les passions mortes des chevaliers errants:
Mais que salubre est le vent.
Que le piéton regarde à ces claires-voies:
Il ira plus courageux.
Soldats des forêts que le Seigneur envoie,
Chers corbeaux délicieux!
Faites fuir d’ici le paysan matois
Qui trinque d'un moignon vieux.
O ADORMECIDO DO VALE
É um recanto verde onde um rio canta, Atrelado à grama com resquícios de prata
Onde o sol sobre a altiva montanha Brilha: é um pequeno vale que raia. Um jovem soldado, com a boca aberta, cabeça nua, E a nuca banhada em agrião azul com frescor, Dorme; ele está na grama, nuvem com chuva, Pálido em sua cama verde à luz e ao calor. Com os pés nos gladíolos, ele dorme. Sorrindo como uma criança doente, ele está dormindo:
Natureza, trate-o com carinho, ele está com frio. O perfume não chega às suas narinas; Ele dorme no sol e tudo se tranquiliza
No lado direito são dois buracos de tiro – o vazio.
LE DORMEUR DU VAL
C’est un trou de verdure où chante une rivière, Accrochant follement aux herbes des haillons D’argent; où le soleil, de la montagne fière, Luit: c’est un petit val qui mousse de rayons. Un soldat jeune, bouche ouverte, tête nue, Dort; il est étendu dans l'herbe, sous la nue, Pâle dans son Et la nuque baignant dans le frais cresson bleu, lit vert où la lumière pleut. Les pieds dans les glaïeuls, il dort. Souriant comme Sourirait un enfant malade, il fait un somme: Nature, berce-le chaudement: il a froid. Les parfums ne font pas frissonner sa narine; Il dort dans le soleil, la main sur sa poitrine, Tranquille. Il a deux trous rouges au côté droit.
*Estas traduções fazem parte do volume Rimbaud andarilho.
Jean-Arthur Rimbaud, poeta simbolista francês (1854-1891). Seu pai era militar, e a mãe, católica devota. No colégio de Charleville, sua cidade natal, aprendeu grego e latim e escreveu os primeiros versos. O Barco Bêbado, sua primeira obra-prima, foi escrita aos 16 anos. Fugindo de casa para viver em Paris, o jovem Rimbaud entregou-se à bebida, ao jogo, aos estudos esotéricos e aos entorpecentes. Seu caso amoroso com Verlaine resultou em escândalo. Após escrever Uma Temporada no Inferno (1872) e Iluminações (1874), poemas em prosa construídos numa linguagem imagética visionária, o poeta renunciou a sua arte e viajou para a África, onde se dedicou ao tráfico de armas e escravos. Contraindo séria doença, veio a falecer aos 37 anos. Rimbaud é o poeta maldito por excelência, e influenciou os surrealistas, a Geração Beat e a contracultura.
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