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Andrea Zanzotto por Patricia Peterle


Andrea Zanzotto por Danilo de Marco



IDEIA


E todas as coisas ao meu redor

capto antecedentes no existir.

Morna verde a nitidez dos dias

oculta, macia os asperge,

de insetos e pássaros se agita e cintila.

Tudo está cheio e caótico,

tudo, escuro, triunfa e se prostra.

Também pra ti, minha linguagem, faísca

e travessia, por desconsolado sono

por erros e delíquios

por preguiças profundas insondáveis,

que te formaste corrupta e absoluta.

Também tu minha breve nitidez

de células mentais, tronco halo

de urros e pensamentos

imprevisto e eternos.

E sem vida a palpitação dos frutos

e das selvas e da seda e dos

revelados cabelos de Diana,

do seu docíssimo sexo feliz,

e, agra e vívida, a ardência

que nas unhas penetra e nas forragens

prontas a ferir,

e o nunca mudo e pago coração,

tudo é rico e perdido

morto e insurgente

entretanto na luz

na minha vã claridade de ideia.




IDEA


E tutte le cose a me intorno

colgo precorse nell’esistere.

Tiepido verde il nitore dei giorni

occulta, molle li irrora,

d’insetti e uccelli s’agita e scintilla.

Tutto è pieno e sconvolto,

tutto, oscuro, trionfa e si prostra.

Anche per te, mio linguaggio, favilla

e traversia, per sconsolato sonno

per errori e deliqui

per pigrizie profonde inaccessibili,

che ti formasti corrotto e assoluto.

Anche tu mio brevissimo nitore

di cellule mentali, tronco alone

di gridi e di pensieri

imprevisti ed eterni.

Ed esanime il palpito dei frutti

e delle selve e della seta e dei

rivelati capelli di Diana,

del suo felice dolcissimo sesso,

e, agra e vivida, l’arsura

che all’unghie s’intromette ed alle biade

pronte a ferire,

e il mai tacente il mai convinto cuore,

tutto è ricco e perduto

morto e insorgente

tuttavia nella luce

nella mia vana chiarità d’idea.




EU ATESTO


Não pra ti amor nu


Não pra ti monte nu

se endereça a haste de ouro

que a minha caneta projeta na noite.

Em neon raios se enliriam.

Deneb – e a seringa no ninho de água estéril

Escândalo e sinos

na tetra cidade ao pé do monte.

Monte: horas com olho de osso

longuíssimas versas,

sabor estável de ervas, manto de ervas,

miragens amargurantes de fontes.

Olhas a flor murchada num reflexo.

Cai em cima das bandeiras das praças

a tua luz, de monte, luz dirigida

alhures,

o teu peso o teu canto

não ouvido

não habitado.

Olhas a flor num arrepio, surrexit.

Cânfora e sangue de mim

piso, entorpecimento.


Alhures

eu surdamente atesto,

eu descendo do mundo.

O meu amanhã.


Tu (monte) distinto do pulsar

dos semáforos incertos,

deus de desertos e dobras e de noites...



IO ATTESTO


Non a te nudo amore.


Non a te nudo monte

s’indirizza lo stelo d’oro

che la mia penna proietta nella sera.

In neon lampi s’ingigliano.

Deneb – e la siringa nel nido d’acqua sterile.

Scandalo e campane

nella tetra città sotto monte.

Monte: ore dall’occhio d’osso

lunghissime versi,

sapore stabile d’erbe, manto d’erbe,

miraggi amareggianti di fontane.

Vedi il fiore marcito in un riflesso.

Crolla sulle bandiere sulle piazze

la tua luce, di monte, luce volta

altrove,

il tuo peso il tuo canto

non ascoltato

non abitato.

Vedi il fiore in un brivido, surrexit.

Canfora e sangue da me

torpore, pavimento.


Altrove

io sordamente attesto,

io discendo dal mondo.

Il mio domani.


Tu (monte) distinto dal palpito

dei semafori incerti,

dio di deserti e di pieghe e di sere...




IMPOSSIBILIDADE DA PALAVRA


Se contigo, irmã, se em teu lugar

jazendo corpo de vidro, pelo vidro

do caixão de baixo

doce e medroso, o mundo

eu via, ontem, por entre os sussurros

de sinos e a lamúria de novembro

– como num velho filme foi narrado –

se trocava o teu silêncio com o meu,

não maior a aflição, não a morte

maior: e consumido

o lasso equívoco ora me doeria?

E se por ti companheiro, em teu lugar

os fulgurantes prados

a terra cortante a neve

saciada tivesse,

em teu grito como grito meu

por ti, de coração rasgado, que

fatal e fosco dia com feliz rosto

com aberto peito saudado teria.

O que me deixou longe

de vós, do vosso sonho

estéril ou da vossa

humilde apoteose? Talvez aquela

que dizem suja esperança –

e no jogo incitado ainda

por vísceras agitadas

de presente, por físicos esforços

não desertei deste

existir onde terra

toca e bebe a mente, onde o sol

é um martírio distante.

Não desertei, nem seguir-vos me foi dado

além do acontecido

o esquema átono abafado das lágrimas.


Esperança e fé, virtudes que dos céus

descendem, bem mais que o fogo ofendido

de compaixão. Vozes e olhos muito

traídos, mas tu bem mais ofendida

compaixão sem potência, perturbada

alma; nem a ti quis salvar

para no final te perder, piedoso

não fui muito de mim se primeiras e verdes

sempre, nas minhas sombras,

esperança compaixão fé não fostes vós

a que piedade de nós é dita.

E se um dia da lama,

de uma vigília impossível,

ou de uma sede não humana,

ou de uma inominável certeza

eu-não-eu repensasse neste espaço

gota, astuta pedra, nesta

sacra e feroz brevidade de coisas

e fins e signos, se o fogo de Marte

eu visse envolto em suas noites e mares

de efêmeras saudáveis maresias

e moças que se estendem pra abraçar

o lampejar dos ínferos

e a obra que edifica e recai

em si como num sonho, talvez eu também

– réu de esperança e de amor –

se tu fosses, seria eu, tu que é de loucos

o nomear, de loucos o calar?

Tumba densa, espera, eco, de cabeça

cortada: ao mais blasfemo

dos silêncios equivale.

Mas de onde em sons que nada

não de ti cheios ensinam, não céus

nem obras nem semblantes nem o mesmo

ressequido seu contradizer-se,

vou me arrastando e tento?

Das manhãs horrorosas tu me liberta-me

da luz infinita que não conduz

a si as minhas mal postas

paixões, os gestos em vão repetidos,

das manhãs tira-me, dos acordares

no radiante terror,

tu acordar perpétuo sobre ti mesmo.



IMPOSSIBILITÀ DELLA PAROLA


Se con te, sorella, se in tua vece

giacendo corpo di vetro, dal vetro

della bara dal basso

dolce e pauroso, il mondo

veduto avessi, ieri, tra bisbigli

di campane e il compianto di novembre

– come in un vecchio film venne narrato –

se il tuo silenzio col mio mutato avessi,

non maggiore l’affanno, non la morte

maggiore: e consumato

lo stanco equivoco ora mi dorrei?

E se per te compagno, se in tua vece

i folgoranti prati

la terra tagliente la neve

saziata avessi,

nel tuo grido quale grido mio

per te, dal cuore lacerato, quale

fatale e fosco giorno a lieto volto

a aperto petto salutato avrei.

Che mi trattenne lungi

da voi, dal vostro sonno

sterile o dalla vostra

umile apoteosi? Forse quella

che dicono sporca speranza –

e al gioco spinto ancora

da viscere agitate

di presente, di fisici conati,

non disertai da questo

esistere ove terra

tocca e beve la mente, dove il sole

è un lontano martirio.

Non disertai, né seguirvi mi fu dato

oltre l’accadimento

lo schema atono afoso delle lacrime.


Speranza e fede, virtù che dai cieli

discendono, assai più che il fuoco offeso

di carità. Voci ed occhi traditi

assai, ma più tu offesa

carità senza potenza, sgomenta

anima; né te volli salvare

per alla fine perderti, pietoso

non fui troppo di me se prime e verdi

sempre, nelle ombre mie,

speranza carità fede non foste voi

quella che pietà di noi si dice.

E se un giorno dal fango,

da una veglia impossibile,

o da una sede non umana,

o da un’innominabile certezza

io-non-io ripensassi a questo spazio

gocciola, astuta pietra, a questa

sacra e feroce brevità di cose

e sensi e segni, se il fuoco di Marte

cogliessi avvolto alle sue sere e mari

di salutari effimere salsedini

e fanciulle protese ad abbracciare

il luccichio degl’inferi

e l’opera che edifica e ricade

in sé come in un sogno, forse anch’io

– reo di speranza e d’amore –

se tu fossi, sarei, tu ch’è da folli

il nominare, da folli il tacere?

Stipato avello, attesa, eco, di testa

mozza: al più blasfemo

dei silenzi equivale.

Ma donde in suoni che nulla

non di te colmi insegnano, non cieli

né opere né volti né lo stesso

adusto loro contraddirsi,

io mi trascino e tento?

Dai mattini orribili tu liberami

dalla luce infinita che non leva

a sé le mie scomposte

passioni, i gesti invano ripetuti,

ai mattini toglimi, ai risvegli

nel raggiante terrore,

tu risveglio perpetuo su te stesso.



De Vocativo (1957), Andrea Zanzotto (1921-2011)



Tradução: Patricia Peterle

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