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1 poema de Luis Turiba




POR QUE NÃO TE CALAS, GENERAL?


por que não te calas, general? fixe teu olhar

de lentes míopes na velha farda verde oliva

pendurada na cadeira do canto direito da antessala

y lembre-se: um dia ela foi garbosa passada

no brilho, e assim a vestiste como comandante

de tropas com desbravadores pracinhas a marchar

patriotas a guerrear contra forças nazifascistas

no infernal inverno europeu da velha Itália

sinta na farda, general, como cintilam ainda as

quatro estrelas – oito sobre teus ombros –

rumo ao buraco negro da Cosmologia de um

triturador de planetas estrelas e sistemas

galácticos que giram por todos os lados atraindo

tudo aquilo que nos rodeia para dentro de um

energético campo magnético onde vai dar em

nada nada nada do que buscamos encontrar no

sem-fim deste lugar onde sequer sonhamos estar

pare e pense, general, no silêncio deste infinito moinho

sideral onde repousa um complexo dialético de mundos

seres signos sentimentos de forças contraditórias a nós

levar para um além inimaginável de qualquer poder

terráqueo: nada a ver com este poderzito de mierda,

tão microscópio, poeira passageira, três zeros à esquerda,

diante da grandeza que a natureza nos proporciona

não funciona a pequenez mesquinha da podridão

idiotizantes fofocas fruticas intrigas fakes

fraticidas que produzem anticlimax do caos suástico

o humano é cisco no olho e ilusão. imagine o tamanho

do teu País-pátria-nação, general; & não desonre tua velha

farda de calça descosturada nos fundilhos. não mais traia

tua tropa tão estuprada por tentativas de usos avessos;

nem achincalhe nossa bandeira onde juraste lealdade

à Constituição e aos poderes da República que estão

cansados de serem sacaneados por podres corruptos

de princípios meia-bombas. reconstrua a tua democracia

interior fragmentada por negociatas sigilentas; não

cuspas no chão do quartel onde marchastes tuas botas

vai cuidar, general, do teu velho pijama de seda chinesa

& não ceda mais os caminhos evolutivos do bem-estar

da nossa gente produtiva e inventiva, esse teu povo

miscigenado trabalhador honesto e feliz que caminha

pelas trilhas e pelos trilhos urbanos selvagens das florestas

onde permitistes queimar para a venda do nosso pau-brasil

cujas quadrilhas envenenam rios matas peixes indígenas

sabes que dia é hoje, general? 20 de novembro de 2022

dia de Zumbi, o de Palmares, o comandante dos quilombos,

o da libertação do povo africanos trazidos escravos. assim,

aprenda a tratar o teu silêncio não como sigilos centenários.

esses serão quebrados em respeito à vontade e aos destinos

dos que só possuem um dono: eles mesmos escolheram

os caminhos da liberdade, da verdade e da fraternidade

por fim, general, saiba que o buraco é mais embaixo

sem mais a tratar, passar bem e faça-me o obséquio de tomar

o seu rivotril para evitar os pesados pesadê-los (e não tê-los).

Rio, Laranjeiras, praça São Salvador



 

Luis Turiba é pernambucano criado no Rio de Janeiro. Tem a idade do Maracanã e trabalhou toda vida com textos, notícias, culturais e políticas - e muita poesia de invenção e busca de uma linguagem própria. Na década de 70 foi morar em Brasília, onde trabalhou no Correio Braziliense. Em 1985, com o fim do ciclo das ditaduras militares, fundou com um pequeno grupo de jornalistas e designers a revista Bric a Brac. De volta ao RJ, publicou três livros pela editora 7 Letras: Qtais, Desacontecimentos e Poeira Cósmica. Criou o bloco de carnaval Mistura de Santa e em 2022 voltou a editar uma nova Bric a Brac, a sétima, em celebração à Semana de Arte de 22.

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